quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Os radicais livres e seus efeitos: oxidação e estresse oxidativo

A oxidação é um processo metabólico que leva à produ­ção de energia necessária para as atividades essenciais das células. Entretanto, o metabolismo do oxigênio nas células vivas também leva à produção de radicais. Oxidantes são compostos produzidos pelo metabolismo normal do corpo e, se não controlados, podem provocar danos extensivos. A oxidação é uma reação que pode ocorrer nos alimentos provocando a perda do valor nutritivo pela decomposição dos ácidos graxos e a formação de compostos que podem reagir com outros componentes dos alimentos e também serem prejudiciais para os organismos humano e animal. Os radicais livres são átomos ou moléculas com um ou mais elétrons não pareados em seu orbital mais externo, o que os torna extremamente reativos. Essa configuração faz dos radicais livres moléculas altamente instáveis, com meia-vida curtíssima e quimicamente muito reativas. A presença dos radicais é crítica para a manutenção de muitas funções fisiológicas normais.
Organismos aeróbicos derivam o trifosfato de adenosina (ATP) da redução completa do oxigênio (O2) por quatro elétrons, através do transporte mitocondrial de elétrons. Entretanto, se o O2 receber menos de quatro elétrons forma as “espécies reativas de oxigênio” (EROS). As EROS podem estar envolvidas na etiologia de diversas doenças humanas, tais como a doença arterial coronariana, acidente vascular cerebral (AVC), artrite reumatóide e câncer.
Na verdade, radical livre não é o termo ideal para designar os agentes reativos patogênicos, pois alguns deles não apresentam elétrons desemparelhados em sua última camada.
É conveniente recordar que reações de redução implicam em ganho de elétrons, e as de oxidação, em perda. Portanto, quando no metabolismo normal ocorrer uma redução do oxigênio molecular (O2), este ganhará um elétron, formando o radical superóxido (O2-.), considerado instável por possuir número ímpar, 13, de elétrons na última camada L. Compreendendo as etapas da formação de O2-. podemos verificar que os radicais livres são formados em um cenário de reações de óxido-redução, isto é, ou cedem o elétron solitário, oxidando-se, ou recebem outro, reduzindo-se. Portanto, os radicais livres ou provocam ou resultam dessas reações de óxido-redução.
EROS ou ERMO (“espécies reativas do metabolismo de oxigênio”) são encontradas em todos os sistemas biológicos. Em condições fisiológicas do metabolismo celular aeróbio, o O2 sofre redução tetravalente, com aceitação de quatro elétrons, resultando na formação de H2O. Durante esse processo são formados intermediários reativos, como os radicais superóxido (O2-.), hidroperoxila (HO2.) e hidroxila (OH), e o peróxido de hidrogênio (H2O2). Normalmente, a redução completa do O2 ocorre na mitocôndria, e a reatividade das ERMO é neutralizada com a entrada dos quatro elétrons.
Radical superóxido (O2-.): Pode ser escrito como O2-. ou O2- e é formado após a primeira redução do O2. O radical superóxido ocorre em quase todas as células aeróbicas e é produzido durante a ativação máxima de neutrófilos, monócitos, macrófagos e eosinófilos. Apesar de ser considerado pouco reativo em soluções aquosas, tem sido observada lesão biológica secundária a sistemas geradores de O2-. (seja enzimático, fagocítico ou químico).
Radical hidroperoxila (HO2.): Representa a forma protonada do radical superóxido, ou seja, possui o próton hidrogênio. Existem evidências de que o hidroperoxila é mais reativo que o superóxido, por sua maior facilidade em iniciar a destruição de membranas biológicas.
Radical hidroxila (OH.): É considerada a ERMO mais reativa em sistemas biológicos. A combinação extremamente rápida do OH. com metais ou outros radicais no próprio sítio onde foi produzido confirma sua alta reatividade. Assim, se o hidroxila for produzido próximo ao DNA e a este DNA estiver fixado um metal, poderão ocorrer modificações de bases purínicas e pirimidínicas, levando à inativação ou mutação do DNA. Além disso, o hidroxila pode inativar várias proteínas (enzimas e membrana celular), ao oxidar seus grupos sulfidrilas (-SH) a pontes dissulfeto (-SS). Também pode iniciar a oxidação dos ácidos graxos polinsaturados das membranas celulares (lipoperoxidação).
Peróxido de hidrogênio (H2O2): Apesar de não ser um radical livre, pela ausência de elétrons desemparelhados na última camada, o H2O2 é um metabólito do oxigênio extremamente deletério, porque participa da reação que produz o OH.. O H2O2 tem vida longa, é capaz de atravessar camadas lipídicas, pode reagir com a membrana eritrocitária e com proteínas ligadas ao Fe++5. Assim, é altamente tóxico para as células; esta toxicidade pode ser aumentada de dez para mil vezes quando em presença de ferro6, como ocorre, por exemplo, na hemocromatose transfusional.
Oxigênio singlet (1O2): É forma excitada de oxigênio molecular e não possui elétrons desemparelhados em sua última camada. O 1O2 tem importância em certos eventos biológicos, mas poucas doenças foram relacionadas à sua presença.
Por outro lado, desempenham importantes papéis fisiológicos, como o controle da pressão sangüínea, na sinalização celular, na apoptose, na fagocitose de agentes patogênicos, na fertilização de ovos e no amadurecimento de frutos. Embora as ERMO possam ser mediadoras de doenças, sua formação nem sempre é deletéria, como na defesa contra a infecção, quando a bactéria estimula os neutrófilos a produzirem espécies reativas com a finalidade de destruir o microorganismo. Contudo, poderão ocorrer vários eventos nosológicos, se houver estímulo exagerado na produção dessas espécies, e a ele estiver associada uma falha da defesa antioxidante
A produção excessiva de EROS, por algum processo fisiopatológico, excede a capacidade protetora do organismo, resultando em estresse oxidativo (EO). O EO pode causar danos às membranas celulares, proteínas, à molécula de ácido desoxirribonucléico (DNA) e lipídios conduzindo a quadros de lipoperoxidação. O processo de lipoperoxidação pode desencadear alterações na estrutura e na permeabilidade endotelial predispondo ao desenvolvimento de placas ateroscleróticas. O estress oxidativo tem sido associado ao desenvolvimento de muitas doenças crônicas e degenerativas, incluindo o câncer, doenças cardíacas, doenças degenerativas como Alzheimer, bem como está envolvido no processo de envelhecimento.O balanço entre o estress oxidativo e as funções antioxidantes dos organismos vivos parece ter um papel na carcinogênese. Estudos clínicos e epidemiológicos têm mostrado evidências de que antioxidantes fenólicos de cereais, frutas e vegetais são os principais fatores que contribuem para a baixa e significativa redução da incidência de doenças crônicas e degenerativas encontradas em populações cujas dietas são altas na ingestão desses alimentos. Desta forma, a importância da pesquisa por antioxidantes naturais tem aumentado muito nos últimos anos. Compostos típicos que possuem atividade antioxidante incluem a classe de fenóis, ácidos fenólicos e seus derivados, flavonóides, tocoferóis, fosfolipídios, aminoácidos, ácido fítico, ácido ascórbico, pigmentos e esteróis. Antioxidantes fenólicos são antioxidantes primários que agem como terminais para os radicais livres.
O aumento nos níveis de triglicerídeos (TG) e da lipoproteína de baixa densidade (LDL), associados à diminuição dos níveis da lipoproteína de alta densidade (HDL), favorece o ataque de radicais livres. Isso forma uma LDL modificada, que se deposita na camada média dos vasos sanguíneos induzindo o processo aterosclerótico. Dados consistentes da literatura demonstram que uma das conseqüências do ataque dos radicais livres é o aumento da carbonilação de proteínas. Lesões teciduais associadas a sangramentos também podem liberar hemoglobina (Hb) e ferro, favorecendo reações oxirredutoras, como nos tumores e na artrite reumatóide, quando o ferro é liberado da Hb após microssangramentos.
Todos os componentes celulares são suscetíveis à ação das ERMO, porém a membrana é um dos mais atingidos em decorrência da peroxidação lipídica, que acarreta alterações na estrutura e na permeabilidade das membranas celulares. Conseqüentemente, há perda da seletividade na troca iônica e liberação do conteúdo de organelas, como as enzimas hidrolíticas dos lisossomas, e formação de produtos citotóxicos (como o malonaldeído), culminando com a morte celular. A lipoperoxidação também pode estar associada aos mecanismos de envelhecimento, de câncer e à exacerbação da toxicidade de xenobióticos. Assim como na formação das ERMO, nem sempre os processos de lipoperoxidação são prejudiciais, pois seus produtos são importantes na reação em cascata a partir do ácido aracdônico (formação de prostaglandinas) e, portanto, na resposta inflamatória. Todavia, o excesso de tais produtos pode ser lesivo. O radical hidroxila (OH.) é freqüentemente reconhecido como a espécie iniciadora e a mais importante da lipoperoxidação. Entretanto, estudos recentes indicam que o ferro também desempenha papel determinante na iniciação deste processo, sendo necessária uma relação equimolar Fe+++ : Fe++ no meio, para que ocorra a lipoperoxidação.

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